quarta-feira, 25 de maio de 2011

A cura do desiludido

Essa postagem já seria a minha próxima. Mas foi motivada a sair logo da cabeça pela minha prima thaís, que pensa como eu e me fez ontem acreditar nas minhas próprias palavras.

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Que peça engenhosa! Que maravilha de design!... de desenho do comportamento! Essa obra iniciada há um tempo que nenhum de nós tem a propriedade de imaginar: nosso senso de compreensão, esse que consome o que se desenvolve à nossa volta - o velho, o novo, o estático, o que se agita em desordem, o harmônico, os sons, as frequências, o que é quente e o que é frio, e tudo mais que nos arranca o desinteresse, a indiferença; esse senso que é despertado, excitado a cada milésimo de segundo, fazendo perder o próprio segundo o seu poder de unidade, de referência de pequeno. Pois se em tão minúscula definição de tempo, já se perde a conta de mundos visitados,  ou condições experimentadas (e por que não grandiosas, mas fugitivas natas, que se perdem tão rapidamente quanto surgem), o que não se faz com minutos, horas?!... -, esse senso não conta com estrutura para entender a sua própria construção! Ele mesmo é construído pela auto digestão, que renova sua propriedade de reflexão, mudando o mundo que se vê, que retribui e muda ele, que o muda de volta, e depois é a vez do outro!... e fica nisso... para todo o seu sempre! Esse senso que não está ligado – ele é ligado – e independe de memória ou informação passada: ainda que no fundo seja apenas isso, ele atua no presente, e apenas ali, no espaço do iminente, do estalo! Ou nem se deva dizer que chega a um estalo, aparenta ser menor que ele... e talvez nem se misture ao tempo!; mas ao menor instante se aprimora, desses incontáveis que nós vivemos. Esse é o instinto!

Ora, mas e a cura, onde? Pois a cura, o trato das patologias, é o seu conhecer. O saber mais, a quebra incansável de todos os elementos, até que sobrem fragmentos, mas ordenados: o sopro de clareza que ajuda a se apossar do sentido do todo. A construção é a origem da evidência. E só se fala em evidência, em ter poder sobre ela, com o mínimo de trato minucioso, paciente. E esse instinto, e a maneira como se infiltra e domina, o seu modo de operação, são essenciais para entender o que acontece ao desiludido... e entender é ter força, é manuseio, é controle! Estar acima de um problema é enxergá-lo de cima e, tão importante quanto, se enxergar de cima! O instinto vai contra tudo isso, é essencialmente caloroso, interno. Visão de momento, apenas naturalmente renovável. E por tudo isso, há de se aprender a separá-lo da parcialidade emocional frágil, incompleta, obscura e duvidosa. Pois ele, enquanto sistema operacional, exige um posicionamento incisivo, de mudança, de movimento e melhora!, ou então se põe a serviço do inseguro, e se volta contra o indivíduo, servindo de incentivo ao confuso, obstruindo o real desejo, pois mesmo isso pode se encontrar meio indecidido, sem saber no que se apoiar ou mesmo diferenciar o que se quer e o que se acha que quer...

Perigo, ao iludido, é o desejo vago. A indefinição da sua vontade é o atrofiamento do impulso, um sufocante golpe ao apetite verdadeiro, à vida intensa e levada ao extremo, ou mesmo à vida em si. É o abafo do mais puro e sincero sentimento que experimenta o ser humano: a fúria do querer! - e que o capricho da covardia, do pensar demais, assolando mesmo a intuição, reprime o próprio ser humano em prol de jogadas acanhadas, ajustadas ao mundo do outro, que se assemelham à suplicas para que dê certo, deixando o controle da sua quietação em mãos que não são suas. E este é o maior erro que se pode cometer, talvez o único - é um atentado à vida, à boa vivência, e mesmo à elevação do seu ser - que se subjuga, colocando-se em patamar de igualdade aos demais e assumindo assim não ter força, quando deveria agir com os modos de um animal, que se sujeita às linhas de sua programação e apenas faz! O homem nem sempre precisa agir como homem.

Mas esse último parágrafo é apenas uma ressalva. Pois se começa errado, termina errado. Não por superstição, mas pelo comportamento em vigor. O que divulgo como cura precisa de certeza. Essa é, de certa forma, a cura em si. Ela está em todas as etapas: a certeza de querer esquecer, de não mais querer, do se querer bem! O justo consigo é capaz, soberano, aprende a por fim ao que vai contra ele. E com isso, pouco chegará a se iludir - e não só por evitar criar expectativas (a única que se cumpre por inteiro é apenas a de si para si), mas também por saber lidar com as abatidas. Ele se enche de poder, não admite ser encostado, maltratado, pois ele próprio é o valor maior. E sua vontade se infiltra, e faz acontecer, não espera. Essa é a cura em sua definição teórica.

Esquecer não é um ato; é a ausência de um. O ato que asfixia e traz pesar é o de admitir querer esquecer. Ver à força, na resposta que tu recebeu, os sintomas que denigrem o seu pensar, aquele desejo ardente de querer amar, botar toda a ira, a luxúria, a sua paixão cega para fora! - e ser esbofeteado, puxado pelo pé de volta ao fundo, quando já chegava à superfície... e, tanto quanto lembrar dos teus sonhos - que afloram ao natural, e te era prazeroso enquanto tinha abertura para colocar tudo aquilo em forma, criar aquela sua realidade (não há nada melhor do que construir na realidade o que se tem por dentro!) - agora sofre em duas frentes: a de admitir que o desfecho planejado não mais tem valor e administrar o ainda querer, empurrando-o com força capenga e indecisa de volta à categoria de fantasia, simples fábula... admitir que eram todos personagens de história inventada, menos você, que sempre esteve sozinho, e isso agora lhe foi cuspido....

E tudo isso não passa de um assassinato de ideia. mas mesmo que não configure um crime, é tão difícil quanto o ilegal, pois em ambos a dificuldade é a de assumir frieza, e manter a posição gélida, de querer fazer não mais viver, e não apenas deixar de lado todos os sonhos construídos - eles são de natureza idealizada, logo fortes!, persistem com sua ideia, trazem ainda (malditos!) prazer, quando por um minuto se desliga da realidade... -, mas botá-los abaixo, implodir o teu próprio patrimônio, já que aquilo não é mais fértil e só atrapalha uma nova construção.

E quando ele surgir, com a tua decisão como armamento, se entregue ao impulso da indiferença, com a diferença de que é uma ação de ataque, desta vez, e não um desleixo. Não há redenção sem sofrimento, não se esquece sem admitir a morte com o seu sepultamento! Do contrário, a putrefação do corpo continua a trazer lembranças velhas, inúteis, do que se foi, do que não foi e do que não será, e acompanha ainda o mau cheiro característico do que está mal guardado. E é só disso que se trata! De morte, da privação de vida e vontade da sua ideia morta! Admitir o nunca mais - ver, falar, tocar, beijar, ouvir... imaginar tal ideia! Nada mais disso importa. Nada morto importa.

A única coisa que importa é a sua vida pulsante e as escolhas apaixonadas! E a ambição por mais, e mais, e mais, e mais... e quantos outros mais sem repetir, sem que isso sequer possa chegar perto [de chegar perto (DE CHEGAR PERTO!!)].....de esgotar a graça da vida. A própria vida em si é a maravilha!

Nada mais.

2 comentários:

  1. Algumas opiniões:
    - O maior bem que se possui é a vida.
    - Ninguém, nunca está sozinho. Há sempre alguém conectado (aproveitando a modernidade!), por pensamento, em alguém.
    - Não existe cura. Existem processos de cicatrização física e/ou mental, que após concluídos e bem assimilados nos farão sentir melhor, por conta da experiência e vivência neles contidos. O contrário, infelizmente, também pode ocorrer. Mas, aí não é cura.

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  2. Você escreve muito bem. Que tal um livro? Certamente você já pensou nisso. E também já sabe sobre o que escrever.

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